Brasil no vermelho: famílias batem recorde de dívidas enquanto crédito fácil disfarça crise silenciosa

Em mais um retrato da instabilidade financeira que assombra os lares brasileiros, a Confederação Nacional do Comércio (CNC) divulgou um dado alarmante: 77,1% das famílias estavam endividadas em março de 2025. A notícia pode até parecer um dado técnico, mas esconde uma realidade preocupante — o Brasil se tornou refém do crédito e da ilusão do consumo.

Apesar do crescimento do endividamento — o segundo mês seguido de alta — a inadimplência (leia-se: gente que não consegue pagar o que deve) se manteve estável em 28,6%. Mas será isso mesmo um bom sinal? Para especialistas críticos, essa “estabilidade” nada mais é do que uma anestesia econômica: o brasileiro está empurrando dívidas com a barriga, fazendo malabarismos com o cartão de crédito, carnês e empréstimos para não estourar de vez.

E tem mais: o crédito rotativo e os carnês de loja — notoriamente mais caros — estão ganhando espaço, o que pode indicar não uma “melhora na consciência financeira”, como quer acreditar a CNC, mas sim desespero para manter as contas básicas em dia.

“O avanço do endividamento com estabilidade da inadimplência sinaliza maior consciência no uso do crédito”, afirmou o presidente da CNC, José Roberto Tadros, em tom otimista. Mas críticos retrucam: isso é consciência ou desespero disfarçado?

Enquanto isso, a fatia das famílias que já jogou a toalha e não consegue mais pagar as dívidas ficou em 12,2% — quase o mesmo de março de 2024. A única “boa notícia” é que as dívidas mais antigas estão diminuindo: menos gente está inadimplente há mais de 90 dias. Mas isso não significa solução — apenas que as famílias estão renegociando e acumulando novos prazos, criando uma bola de neve disfarçada de alívio temporário.

Outro dado que incomoda: 20,8% das famílias brasileiras gastam mais da metade de toda a renda só para pagar dívidas. O nome disso, para alguns analistas, é “ser economicamente refém do sistema financeiro”.

E adivinhe qual é o vilão favorito da vez? Ele mesmo: o cartão de crédito, responsável por 83,7% das dívidas. Embora tenha perdido um pouco de espaço em relação a 2024, continua reinando como a principal armadilha financeira dos brasileiros.

Carnês ressurgem e acendem alerta vermelho

Em plena era dos bancos digitais, os carnês estão de volta — uma modalidade ultrapassada, mas que cresceu entre os endividados. Para Felipe Tavares, economista-chefe da CNC, isso mostra que o brasileiro está apelando para o que tem à mão: “formas alternativas, porém mais caras, de manter o consumo ou simplesmente sobreviver”.

Pobres mais endividados, ricos mais inadimplentes?

Os dados revelam ainda uma ironia perversa: quanto menor a renda, maior o endividamento — mas menor a inadimplência. Isso porque as famílias de baixa renda simplesmente não podem se dar ao luxo de não pagar: é pagar ou perder o básico.

A classe mais pobre, com até três salários mínimos, atingiu 80,7% de endividados. Mas mesmo assim, conseguiram diminuir levemente a inadimplência. Já entre os mais ricos (acima de 10 salários), a inadimplência subiu. Seria sinal de que a classe alta se permite atrasar mais porque tem margem de negociação?

Expectativas pouco animadoras

A CNC prevê que o endividamento deve crescer mais 2,5 pontos percentuais até o fim do ano, impulsionado por uma “maior confiança no consumo” — ou talvez, dizem críticos, por uma economia que não dá escolha senão viver a crédito. A inadimplência deve cair só 0,7 ponto percentual, o que mal arranha a superfície do problema.

No fim das contas, a pesquisa da CNC parece querer pintar um quadro otimista. Mas, olhando os números com lupa, o cenário é outro: o Brasil vive uma epidemia de dívidas mascarada de otimismo econômico, onde a sobrevivência depende de crédito, e a estabilidade é só uma miragem.

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