Ministro Fux e o papel das garantias no processo penal

 

O voto do ministro Luiz Fux, proferido nesta quarta-feira (10), no julgamento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal que analisa a suposta trama golpista capitaneada por Jair Bolsonaro, representa uma reviravolta significativa em sua fama de magistrado conservador quanto às garantias fundamentais.

Conhecido por ser o ministro que mais nega Habeas Corpus, e por isso apontado como “menos garantista”, Fux surpreendeu ao adotar uma postura firme em defesa de princípios constitucionais básicos, como o juiz natural, o contraditório e a ampla defesa.

O ponto central do voto foi o entendimento de que o Supremo não tinha competência para julgar o caso, dado que nenhum dos réus, inclusive Bolsonaro, exercia mais função pública com foro por prerrogativa. Para Fux, o julgamento deveria ter tramitado na primeira instância.

Além disso, o eminente ministro considerou a recente alteração no Regimento Interno do STF que estendeu o foro após o fim de mandato como inaplicável ao caso, o que em seu entendimento, violaria o princípio do juiz natural e colocaria em risco a segurança jurídica, tema que, inclusive é bastante recorrente na seara processualista penal.

Em complemento, o ministro acolheu a alegação de cerceamento da defesa sobre “tsunami de dados” disponibilizados a partir de elementos tardios, sem possibilidade de adequada análise, e declarou a nulidade do processo desde o recebimento da denúncia. Fux foi além e questionou a tipificação de organização criminosa armada, defendendo que não houve comprovação de reiteração delitiva nem uso efetivo de armas pelos réus, afastando, assim, parte das imputações mais graves.

Vale ressaltar que as garantias processuais não são privilégios, mas pilares que protegem tanto os acusados quanto o próprio Estado de arbitrariedades. Afirmar o juiz natural, impedir aplicação retroativa de mudanças de competência, garantir tempo e condições de defesa são medidas que fortalecem o Estado Democrático de Direito.

Em tempos em que a polarização ameaça o equilíbrio institucional, o STF e cada ministro devem incorporar essa visão garantista. Não apenas em casos de excepcionalidade política, mas em todos os processos, independentemente da figura envolvida.

A centralidade das garantias no processo penal é um dever constitucional, que preserva a justiça imparcial e a confiança da sociedade em suas instituições.

Do voto de Fux, em rompimento ao seu histórico, é possível abstrair uma lição valiosa, a de que o direito de defesa deve sempre ser respeitado em essência e em forma.

*Advogado, sócio proprietário do escritório Segatto Advocacia, Mestre em Direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa de Brasília/DF, especialista em Direito Penal Econômico pela PUC-MG, especialista em Direito Penal e Processo Penal FESMP/MT, especialista em Direito Eleitoral e Improbidade Administrativa pela FESMP/MT, e especialista em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *