Estudo acadêmico aponta que falhas na ressocialização estão diretamente ligadas à precariedade das unidades e à falta de efetivo
Você se sentiria seguro sabendo que unidades prisionais em Mato Grosso operam com quatro vezes mais detentos do que a capacidade e com número reduzido de policiais penais? Esse é o retrato atual do sistema penitenciário do estado, segundo dados levantados por pesquisadores e pelo Sindicato dos Servidores Penitenciários (Sindsppen-MT).
Quatro das cinco penitenciárias estaduais estão acima do limite de ocupação, enquanto a escassez de servidores agrava episódios de fugas, violência e entrada de ilícitos. O sindicato afirma que o sistema entrou em “colapso” e cobra a convocação imediata dos aprovados no último concurso.
Falta de efetivo e segurança precária
Na Penitenciária Feminina Ana Maria do Couto May, em Cuiabá, apenas nove policiais penais cuidam de 360 custodiadas e mais de 100 presas em atividades internas. Foi de lá que escaparam, no dia 17 de agosto, as detentas de alta periculosidade Angélica Saraiva de Sá, a “Angeliquinha”, e Jessica Leal da Silva, a “Arlequina”. Só em 2025, já foram registradas pelo menos 13 fugas em diferentes unidades, como o Complexo Ahmenon Lemos Dantas (Várzea Grande), a Penitenciária Central do Estado (Cuiabá) e a Major Zuzi Alves da Silva (Água Boa).
Segundo o presidente do Sindsppen, Amaury Benedito Paixão, o déficit de servidores compromete tanto a segurança quanto os programas de ressocialização: “É brincar de fazer segurança. As unidades sofrem com falta de efetivo, câmeras inoperantes e frentes de trabalho sem monitoramento adequado. Isso é desumano”.
Ressocialização comprometida
Um estudo publicado na OWL Journal por pesquisadores da UFMT e Unemat destaca que a Lei de Execução Penal prevê assistência integral aos presos, mas a realidade em Mato Grosso é marcada por superlotação, falhas estruturais e ausência de políticas eficazes de reintegração. “O sistema acaba se tornando um espaço de reprodução da violência”, concluem os pesquisadores.
Resposta do governo
Procurada, a Secretaria de Estado de Justiça (Sejus) alegou que as fugas registradas ocorreram por “quebra de protocolos operacionais” e que a Corregedoria-Geral e a Polícia Civil apuram os casos. Em paralelo, a pasta editou a Portaria nº 70/2025, restringindo manifestações públicas de servidores sobre o sistema penitenciário sem autorização prévia.
Investimentos insuficientes
Apesar de aportes superiores a R$ 150 milhões para reestruturação do sistema após Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público, quatro das cinco penitenciárias ainda seguem superlotadas. Para especialistas, os números mostram que a raiz do problema não é apenas estrutural, mas de gestão e recursos humanos.