Depois de uma reunião de emergência no Palácio do Planalto, na noite desta quarta-feira (9), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi às redes sociais para responder à carta enviada pelo presidente norte-americano Donald Trump. Sem amenizar o tom, Lula voltou a enfatizar que o Brasil é um país soberano e não aceitará ingerência estrangeira em suas instituições ou no processo judicial que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado.
“O Brasil é um país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém. O processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de Estado é de competência apenas da Justiça Brasileira e, portanto, não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais”, afirmou o presidente.
Na mesma mensagem, Lula rebateu as críticas de Trump ao Supremo e às restrições impostas às redes sociais. Segundo ele, as decisões da Corte decorrem da resistência das plataformas em remover conteúdos criminosos, sob alegação de liberdade de expressão. “No Brasil, liberdade de expressão não se confunde com agressão ou práticas violentas”, frisou.
Sobre as acusações de desequilíbrio comercial, o presidente brasileiro desmentiu o mandatário norte-americano. De acordo com Lula, as estatísticas oficiais dos EUA mostram um superavit de US$ 410 bilhões a favor dos norte-americanos na relação bilateral nos últimos 15 anos. E foi categórico: caso Trump leve adiante a promessa de elevar em 50% as tarifas sobre produtos brasileiros, o Brasil responderá na mesma moeda. “Qualquer medida de elevação de tarifas de forma unilateral será respondida à luz da Lei brasileira de Reciprocidade Econômica”, declarou.
Reação no governo e no Itamaraty
Ainda durante a tarde, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) classificou as declarações de Trump como “mal-informadas” e criticou a acusação de perseguição a Bolsonaro. “O presidente Lula ficou preso por quase dois anos e ninguém questionou a democracia ou o Judiciário brasileiro”, lembrou. Alckmin, que também participou da reunião no Planalto, reforçou que o Brasil não representa ameaça econômica aos Estados Unidos.
No Ministério das Relações Exteriores, o encarregado de negócios da Embaixada dos EUA, Gabriel Escobar, foi convocado pela segunda vez no dia. A diplomacia brasileira devolveu a carta de Trump, considerando o conteúdo ofensivo e baseado em falsidades. A atitude representou um gesto formal de repúdio por parte do Itamaraty.
Supremo e Congresso
No STF, apesar da ausência de reação oficial, ministros consultados avaliaram como previsível a ofensiva de Trump, especialmente após recentes decisões envolvendo o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). O ministro Flávio Dino foi o único a se manifestar publicamente, destacando o papel da Corte na defesa da soberania nacional e da democracia.
Já no Congresso, a crise diplomática acirrou a polarização. Parlamentares bolsonaristas comemoraram o tarifaço e reforçaram o discurso de perseguição política a Bolsonaro, enquanto a base do governo classificou o episódio como traição. O deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) foi um dos mais duros e prometeu acionar a Justiça contra Eduardo Bolsonaro. “Esse cara é um traidor nacional”, disparou.
Ele também responsabilizou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), pelo episódio, ao criticá-lo por se alinhar a Trump e acusar o Judiciário brasileiro de perseguição. “Todas as pretensões políticas dele vão entrar em xeque. A posição da turma bolsonarista é de dobrar a aposta”, afirmou.
A crise, que já se estende desde a cúpula do Brics, chega ao seu ápice, com Brasília e Washington em clima de tensão inédita desde a redemocratização brasileira.