A decisão do governo federal de acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira (1º) com uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), pedindo liminar para restabelecer a validade do decreto que aumentava o IOF, foi estratégica, jurídica — e profundamente política. O movimento, liderado pela Advocacia-Geral da União (AGU), visa não apenas restaurar o imposto, mas preservar a autoridade do Executivo diante do que considera uma interferência indevida do Congresso Nacional.
A derrota do governo na Câmara dos Deputados na semana passada — 383 votos contra 98, em uma votação relâmpago que derrubou o decreto presidencial — acendeu o sinal vermelho no Palácio do Planalto. O assunto foi debatido com urgência entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o advogado-geral da União, Jorge Messias.
“Linha vermelha” e risco de precedente
Segundo fontes próximas ao Planalto, a preocupação não se limitava à arrecadação com o IOF, mas ao precedente institucional que se criaria ao permitir que o Congresso revogue um decreto de competência exclusiva do Executivo — nesse caso, definido pelos artigos 151 e 153 da Constituição. “Se isso passa em branco, o presidente da República, qualquer um, passa a governar sob ameaça permanente de revogação por parte do Legislativo”, avaliou uma fonte do governo.
Jorge Messias foi categórico: “Essa ação visa preservar a integridade, a higidez do ato praticado pelo chefe do Poder Executivo”. Para ele, o decreto permanece válido até que o STF se manifeste.
Congresso reage e Hugo Motta sobe o tom
Apesar de ser uma ação jurídica, a medida foi encarada como afronta política pela cúpula da Câmara. O presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse reservadamente ao governo que não aceitaria a judicialização da questão. Em público, acusou o Planalto de “abrir mão de governar com o Parlamento para governar com o STF”.
A declaração elevou o clima de tensão entre os poderes e mostrou que o embate em torno do IOF pode se tornar um divisor de águas na relação entre Executivo e Legislativo. A ausência de articulação política do governo na Câmara também foi alvo de críticas internas, inclusive de aliados.
Impasses e incertezas
Sem alternativas de compensação imediata para a queda de arrecadação causada pela derrubada do decreto — estimada em R$ 27 bilhões até 2027 —, o governo decidiu enfrentar o embate no Judiciário. Para Lula, não judicializar a questão seria abrir mão de uma prerrogativa constitucional e fragilizar ainda mais sua capacidade de governar sem maioria folgada no Congresso.
No STF, o caso agora será analisado com urgência. A Corte pode decidir liminarmente a favor do governo, o que reacenderia o embate político com o Congresso, ou manter a decisão dos parlamentares, ampliando o desgaste do Executivo.