O 1º de Maio voltou a levar sindicatos e movimentos de esquerda às ruas da capital paulista, mas sem unidade. Ao contrário de anos anteriores, os atos deste Dia Internacional do Trabalhador ocorreram de forma descentralizada, com lideranças distintas e, principalmente, sem a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A ausência do presidente está relacionada à falta de coesão entre as centrais sindicais. Segundo aliados, Lula optou por não comparecer a nenhum ato para evitar constrangimentos com a divisão das entidades. Em vez disso, ele recebeu os dirigentes em Brasília no dia 29, em uma reunião de mais de duas horas, na qual foi entregue uma pauta de reivindicações. “Ele nos chamou a atenção para a necessidade de dialogar com os jovens e se adaptar ao novo mundo do trabalho”, relatou Ricardo Patah, presidente da UGT.
Em São Paulo, a tradicional celebração unificada promovida por Força Sindical, UGT, CTB e Nova Central acontece na Praça Campo de Bagatelle, zona norte da capital. Para atrair público, o evento inclui sorteios de carros e brindes — estratégia criticada por outras organizações.
A CUT, embora convidada, realiza um ato próprio em São Bernardo do Campo, ao lado dos sindicatos do ABC. Essa mobilização retorna após nove anos e será acompanhada por eventos paralelos em cidades do interior paulista, como Araraquara, Bauru, Campinas, Osasco, Taubaté e na Baixada Santista. Ainda assim, o presidente da CUT, Sérgio Nobre, deve discursar no palco das centrais em São Paulo.
As principais bandeiras defendidas nos atos incluem a isenção do Imposto de Renda para salários de até R$ 5 mil, a redução dos juros, a diminuição da jornada de trabalho sem corte de salários e o fim da escala 6×1 — sistema que concede apenas um dia de folga semanal.
Essa última pauta, mais próxima de trabalhadores do comércio e serviços, ganhou força nos últimos meses com o Projeto de Lei apresentado pela deputada Erika Hilton (PSol), inspirado em um vídeo viral do vereador Rick Azevedo (PSol-RJ). Fora do circuito sindical tradicional, o movimento Vida Além do Trabalho (VAT) promove um terceiro ato na avenida Paulista com foco exclusivo na escala 6×1.
Segundo a coordenadora do VAT, Priscila Santos Araújo, o grupo tentou sem sucesso apoio das centrais. “Não é momento para apenas shows. Queremos luta. O trabalhador merece sorteios e festas, mas isso sem mobilização vira só pão e circo”, critica.
A divisão dos atos evidencia a crise de representatividade do sindicalismo brasileiro, agravada por fatores como a reforma trabalhista e mudanças no perfil do mercado de trabalho. Para o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV, a pauta do 6×1 escancarou essa desconexão: “Ela surgiu à margem dos sindicatos e encontrou maior ressonância em lideranças políticas como Erika Hilton”.
Carlos Melo, do Insper, reforça que a dificuldade dos sindicatos em se renovar ficou clara em 2024, quando Lula discursou para menos de 2 mil pessoas em um estádio em Itaquera. “Repetir a lógica dos velhos tempos é um erro. O sindicalismo precisa entender o presente.”
Além disso, os atos deste ano acontecem sob a sombra do escândalo do INSS, que atingiu entidades sindicais. Ainda assim, analistas acreditam que os problemas da mobilização antecedem a operação policial. “Se o 1º de Maio perdeu força, não foi por causa da PF. É reflexo de uma crise mais profunda”, resume Melo.